Um apoio incondicional à causa da preservação ambiental e da floresta em pé, seus povos e sua fauna
Prof. Dr. Ulysses Fagundes Neto
Professor Emérito da Escola Paulista de Medicina – UNIFESP
Tendo em vista a realização da 26ª Cúpula do Clima em Glasgow, Escócia, desejo aproveitar a oportunidade para hipotecar minha mais veemente solidariedade a este movimento. Relembrar alguns tópicos da minha vivência de 30 anos, desde 1970, trabalhando, como médico da Escola Paulista de Medicina, no Parque Indígena do Xingú (PIX), onde aprendi os hábitos e a cultura dos povos nativos que ali vivem, ainda de forma muito similar à época do descobrimento do Brasil pelos portugueses, é sempre uma lição de sabedoria de vida.
Figura 2- Esta foi minha primeira viagem ao PIX em dezembro de 1970, mais especificamente ao Posto Leonardo Villas Boas, no Alto Xingú (vide mapa). Estava ainda a comemorar o fim do curso de graduação em Medicina pela Escola Paulista de Medicina, confraternizando com meus colegas de turma, quando veio um chamamento da FUNAI informando que havia eclodido um surto de gripe envolvendo as diversas aldeias localizadas na região do Alto Xingu. Era um pedido emergencial para que fossem enviados médicos para o PIX a fim de atender a população enferma. Quando fui contactado atendi de imediato ao chamamento, e, foi nesta circunstância, que ocorreu minha primeira atuação como Médico. Meu “batismo de fogo” se deu longe dos meus pagos, no norte de Mato Grosso, a cuidar da nossa população nativa.
Foram 3 semanas de intenso, mas gratificante, trabalho de atenção aos enfermos. Tivemos que improvisar uma enfermaria no pavilhão que serve de dormitório para os visitantes, para atender os pacientes mais graves. Felizmente não perdemos nenhum paciente para a gripe, durante todo o período de duração da epidemia.
Os pacientes que apresentavam quadro clínico de leve a moderado eram atendidos em suas próprias aldeias. Nós nos deslocávamos duas vezes por dia para dar a assistência necessária, ou eles vinham à enfermaria para receber a medicação indicada.
Minha segunda viagem ao PIX se deu em julho de 1971, desta vez no Baixo Xingu, no Posto Diauarum (onça parda). Uma curiosidade, pude escutar pelo rádio o jogo de despedida, do nosso Rei Pelé, da seleção brasileira. O jogo foi no estádio do Maracanã contra a então Iugoslávia, terminou empatado 2×2.
A partir de então foram realizadas incontáveis viagens anuais ao PIX, para continuar a assistência, a prevenção de doenças e, também, realizar importantes pesquisas de avaliação do estado nutricional das crianças índias. Estes inquéritos resultaram na minha tese de Doutoramento em Pediatria, e revelaram que as condições nutricionais das crianças eram excelentes, a despeito de serem populações chamadas de “cultura primitiva”.
Abaixo, seguem algumas imagens da vida cotidiana dos povos nativos habitantes do PIX, obtidas durante minhas viagens ao longo deste período.
1 – Os nativos e seus hábitos culturais
2 – A flora
3 – Nosso trabalho preventivo, assistencial e de pesquisa
Juntamente com Prof. Roberto Baruzzi, coordenador do projeto da Escola Paulista de Medicina no Parque Indígena do Xingú, planejando as atividades de trabalho.
4 – As moradias
5 – O manancial hídrico
6 – A alimentação
Um manjar especial, tucunaré na brasa e beiju crocante, para a degustação dos caraíbas Baruzzi, Mauro e Ulysses
7 – A infância
8 – Momentos de rara emoção: Pai e Filho trabalhando juntos por uma causa humanitária
Em 1998 tive a grande alegria e emoção de encontrar-me com meu filho Ulysses Fagundes, que estava desenvolvendo seu trabalho de Mestrado, reeditando com metodologia sofisticada, o trabalho de Doutoramento que que apresentei em 1977, reafirmando décadas depois que as condições nutricionais das crianças índias do Parque Indígena do Xingú, permanecem excelentes.
9 – Meus caros amigos de longa data que nos deixaram
Na foto acima Tacumã, grande chefe Camaiurá e Pagé respeitadíssimo no Alto Xingú, na década de 1980 e abaixo como seu filho Cotó em 1998. Tacumã faleceu em 2020.
Aritana, chefe Iualapiti, uma das grandes lideranças do PIX, meu grande amigo desde os idos de 1970, na foto acima, e abaixo em 1998. Aritana faleceu este ano de COVID-19.
A sábia profecia do grande cacique Raoni chefe dos caiapós
No início da década de 1980 em uma das minhas viagens a Nova Iorque, onde desenvolvia trabalhos de pesquisa no North Shore University Hospital afiliado da Cornell University, em um fim de semana passeando por Manhatan, encontrei na entrada do Carnigie Hall, onde o cantor Sting estava se apresentando, o poster abaixo escrito em inglês, que eu traduzi. Este poster, escrito há mais de 40 anos, reflete de forma cristalina o pensamento dos povos indígenas, e que foi reafirmado no dia 1/11/2021, pela índia Txai Suruí, a jovem de 24 anos ativista ambiental. Em seu discurso de dois minutos de duração na COP-26, perante mais de 100 chefes de Estado, ela afirmou “Os líderes precisam saber que o que estamos vivendo na Amazonia também é responsabilidade deles”
PS- Um alerta de extrema importância
Atualmente, aos 77 anos de idade, médico há 51 anos dedicados à pesquisa e à assistência, participei de duas epidemias nos anos 1970 na cidade de São Paulo, uma de varíola e a outra de meningite, ambas responsáveis por inúmeras mortes da nossa população. Felizmente elas foram totalmente erradicadas por um robusto e exitoso plano de imunização em massa, que ficou gravado como um exemplo de sucesso da ação da Saúde Pública. Nestes dias atuais há um plano de vacinação em massa contra a COVID-19, disponível para atender toda a nossa população, ela é a única ferramenta verdadeiramente eficaz para dar fim a esta terrível pandemia.
Faça como a população nativa do PIX, que de há muito se conscientizou da importância da imunização como prevenção de inúmeras enfermidades infecto-contagiosas.
VACINE-SE!!!