A Esofagite Eosinofílica (EEo): qual a importância da idade?
Prof. Dr. Ulysses Fagundes Neto
A renomada revista JPGN publicou um artigo, em 2024, intitulado “Eosinophilic esophagitis: Does age matter?”, de Donnchadh O’Sullivan e cols., que abaixo passo a resumir em seus principais aspectos – JPGN 2024;78:1329-36.
Introdução
A Esofagite Eosinofílica (EEo) é uma enfermidade crônica imuno-mediada causada por antígeno alimentar, caracterizada por disfunção esofágica e inflamação com elevada eosinofilia. EEo tem emergido como uma das causas mais proeminentes dos sintomas esofágicos crônicos.
A incidência da EEo tem aumentado de forma notável, especialmente entre os pacientes pediátricos. Essa tendência crescente na incidência torna-se preocupante, considerando-se que a EEo é a causa mais frequente de impactação alimentar e a maior contribuição da disfagia. Além disso, a EEo provoca um significante dano para a saúde e elevação dos custos médicos, levando a importante consequência quanto ao seu manejo e prevenção.
A EEo apresenta-se com variáveis manifestações clínicas dependendo a idade do paciente. Enquanto disfagia ou impactação alimentar é a apresentação clínica mais comum em adultos e adolescentes, em pré-escolares e escolares pode-se apresentar com uma grande amplitude de sintomas, desde dor abdominal, vômitos, dificuldades com a alimentação, e até mesmo sintomas extra-digestivos, tais como, tosse, sibilância ou rouquidão. Lactentes e pré-escolares podem apresentar apenas dificuldades de alimentação, retardo no ritmo de crescimento e sintomas respiratórios, que devem ser levados em consideração quanto ao diagnóstico de EEo.
O diagnóstico da EEo é uma combinação dos achados clínicos endoscópicos e histopatológicos, incluindo a presença de no mínimo 15 eosinófilos por campo de grande aumento (cga), em pelo menos 1 área do esôfago. A inflamação não controlada da EEo pode acarretar fibroestenose, incluindo anéis concêntricos, estenoses fixas, e estreitamento da luz esofágica. O tratamento com corticosteroides ingeridos não absorvíveis e dietas de eliminação tem mostrado uma melhoria histológica variando de 47,1% a 86,7% na redução dos eosinófilos por cga. O presente estudo tem como objetivo comparar as apresentações clínicas, tratamentos, achados endoscópicos, e o seguimento entre as crianças portadoras da EEo, tendo como base suas idades de apresentação.
Métodos
Foi realizado um estudo retrospectivo por meio da revisão de todas as crianças menores de 18 anos diagnosticadas como portadores de EEo durante um período de 15 anos (2005-2020) na Mayo Clinic, Minnesota. Foram excluídas do estudo as crianças que apresentavam enfermidades concomitantes. O diagnóstico de EEo foi confirmado histologicamente com a presença de eosinófilos acima de 15 por cga e a remissão clínica baseou-se na avaliação global dos pacientes pelos médicos durante as visitas de seguimento em resposta ao tratamento. Com relação ao tratamento os pacientes foram divididos em dois grupos, a saber: 1- terapêutica simples: incluindo apenas um medicamento, seja ele inibidor de bomba de próton, eliminação dietética ou utilização de esteroide tópico; 2- terapêutica de combinação: referida ao coletivo de terapias combinadas incluindo uso de inibidor de bomba de próton e dieta de eliminação, ou, inibidor de bom de próton e uso de esteroide tópico, ou, inibidor de bomba de próton, esteroide tópico e dieta de eliminação conjuntamente. As decisões quanto ao tratamento e novas endoscopias de seguimento, foram realizadas de forma colaborativa entre os médicos e os familiares dos pacientes.
As crianças dessas coortes foram classificadas baseando-se na idade do diagnóstico da EEo em 3 grupos etários, a saber: <2anos, 2-<6anos, 6-<18anos. As características na apresentação e o indicie da endoscopia foram comparados entre os 3 grupos de idade utilizando teste do chi-quadrado. A remissão dos pacientes foi avaliada por meio de realização de endoscopia de seguimento.
Resultados
3.1 Identificação da coorte e suas características
Foram identificadas 256 crianças portadoras de EEo com idade média no momento dos diagnósticos de 9 anos, variando de 0,8 a 17,9 anos, sendo 184 (72%) do sexo masculino. A maioria das crianças (172, 67%) foi diagnosticada acima dos 6 anos de idade, enquanto 31 (12%) e 53 (21%) foram diagnosticadas com idades abaixo de 2 anos e entre 2 e 6 anos de idade, respectivamente. A demografia e as características dos 3 grupos etários estão sumarizadas na Tabela 1. Não houve diferença estatisticamente significante entre os grupos etários para sexo, história de atopia ou histórico familiar de atopia.
3.2 Apresentações clínicas e achados endoscópicos
A apresentação clínica mostrou-se diferente de acordo com a faixa etária (Tabela 1). Vômito foi a apresentação clínica mais frequente nas crianças menores de 2 anos e na faixa de 2-6 anos, com taxas de 64% e 53% respectivamente, comparados com 27% naqueles cuja apresentação inicial foi acima de 6 anos de idade. Dificuldades alimentares e ganho de peso insuficiente foram mais comuns naqueles pacientes entre 2 e 6 anos de idade. Disfagia e impactação alimentar e dor abdominal foram mais frequentes nos pacientes entre 6 e 18 anos de idade. Os achados endoscópicos divididos por faixa etária estão mostrados na Tabela 2.
3.3 Manejo terapêutico e remissão endoscópica
Foi obtida informação nos seguimentos das endoscopias em 164 pacientes, cujos resultados da coorte integral e aqueles que alcançaram remissão estão mostrados na Figura 1, enquanto aqueles dados divididos por grupo etário estão mostrados na Tabela 3.
As taxas de remissão em relação às combinações terapêuticas estão descritas na Tabela 4. Considerando-se as terapêuticas de combinação, 85% das crianças com idades <6 anos alcançaram remissão, enquanto nas crianças entre 6 e 18 anos foi alcançada a remissão em 66%. Por outro lado, naqueles pacientes que receberam terapêutica simples, o percentual de remissão foi similar em todos os grupos etários resultando em 46,5%.
Conclusão
Este estudo chama a atenção para a necessidade dos clínicos de considerarem a EEo no diagnóstico diferencial entre as crianças menores de 6 anos de idade que apresentam sintomas tais como dificuldades alimentares, vômitos e perda de peso. Por outro lado, este estudo comprova que a terapêutica de combinação se mostra de maior benefício no manejo nos pacientes portadores de EEo.
Referências bibliográficas
- O’Sullivan D e cols. – JPGN 2024;78:1329-36
- Dellon ES e cols. – Gastroenterology 2014;147:1238-54
- Sun RW e cols. – Laryngospe 2018;128:798-805