Má Absorção à Frutose e Dor Abdominal Recorrente na Infância
Apresentação
Recentemente, tem sido dado um valor da maior importância à ocorrência de Má Absorção/Intolerância à Frutose associada a algumas manifestações clínicas nas crianças e adolescentes. Neste sentido vale a pena trazer ao conhecimento geral o artigo publicado no número de abril deste ano no Journal of Pediatric Gastroenterology and Nutrition (JPGN 2014, 58; 498-501), intitulado Fructose Intolerance/Malabsorption and Recurrent Abdominal Pain Children, subscrito por Maurício Escobar Junior e cols., do Marry Bridge Children’s Hospital, Takoma, Wiscousin, USA.
Introdução
Tem sido demonstrado que um número significante de crianças com dor abdominal padece de transtornos funcionais, tais como, dor abdominal funcional, síndrome do intestino irritável e dispepsia funcional. A frutose é um monossacarídeo de ocorrência na natureza que tem sido cada vez mais utilizada na forma de xarope por ser de custo barato e altamente disponível; portanto, é intensamente utilizada como um aditivo para adoçar alimentos.
Os autores levantam a hipótese de que a intolerância à frutose é uma das etiologias tratáveis de dor abdominal na população pediátrica e, por esta razão, desenvolveram o presente trabalho para investigar a possível intolerância à frutose como causa de dor abdominal na infância, utilizando o Teste do Hidrogênio no ar expirado após sobrecarga de uma dose padronizada de frutose e também verificar a ocorrência do possível alívio dos sintomas, após a introdução de dieta de baixos teores de frutose.
Pacientes e Métodos
O teste do Hidrogênio no ar expirado após sobrecarga de frutose foi realizado em pacientes pediátricos com queixa de dor abdominal recorrente isolada sem causa aparente ou associada com constipação, aumento da eliminação de gases, flatulência e/ou diarreia. Os pacientes receberam uma dose padrão de 1g/kg de frutose até o máximo de 25g. O hidrogênio e o metano no ar expirado foram detectados inicialmente em jejum e a cada 15 minutos durante a primeira hora e a cada 30 minutos durante a segunda hora após terem recebido a sobrecarga de uma solução aquosa 10% contendo frutose. O teste foi considerado positivo (má absorção) caso houvesse um aumento de pelo menos 20 partes por milhão (ppm) de Hidrogênio no ar expirado sobre o valor de jejum.
Os pacientes que apresentaram testes positivos para má absorção de frutose receberam orientação dietética para utilizar uma dieta que evitasse alimentos que contivessem frutose de forma isolada, alimentos cuja concentração de frutose excedesse à de glicose e alimentos ricos em sorbitol. Além disso, os pacientes foram aconselhados a evitar doces, refrigerantes e guloseimas contendo alta concentração de xarope de frutose. Foram providos cardápios específicos atendendo as preferencias alimentares individuais dos pacientes para assegurar requerimentos nutricionais adequados da dieta. Na Tabela 1 estão elencados os alimentos “permitidos” e os alimentos “proibidos”. Os pacientes foram acompanhados pelo período de 2 meses após a intervenção nutricional para avaliação do êxito ou fracasso da modificação dietética recomendada.
Tabela 1- Instrução de dieta de baixo teor de frutose fornecida aos pacientes.
Resultados
Foram estudados 222 pacientes, de ambos os sexos, com idades compreendidas entre 2 e 19 anos, média 10,5, portadores da síndrome de dor abdominal recorrente, de acordo com os critérios de Roma III.
Dentre os 222 pacientes estudados, 121 (54,5%) apresentaram intolerância à frutose e receberam orientação nutricional para a ingestão de uma dieta contendo baixos teores de frutose. Após os dois meses de acompanhamento clínico, tomando-se por base uma escala padronizada de dor, 93 (76,9%) pacientes relataram alívios dos sintomas. Vale ressaltar que a adesão à dieta proposta foi avaliada por meio de um relato pessoal dos pacientes e esta se mostrou próxima da universal dentre eles (Tabela 2).
Conclusões
O presente trabalho embora não seja o primeiro a avaliar a má absorção à frutose na população pediátrica representa a maior casuística sobre o tema. Além disso, confirma as observações prévias de Fagundes-Neto U. e cols. (Arquivos de Gastroenterologia 2013,50:226-230), que demostraram uma relação causal entre má absorção à frutose e um transtorno funcional digestivo. Esta é uma área de grande interesse e reforça o argumento de que a má absorção à frutose pode ser uma causa de dor abdominal recorrente. Embora a dor abdominal recorrente tenha seguramente um componente multifatorial na população pediátrica, acreditamos que os dados aqui apresentados demostram que a má absorção à frutose é uma causa tratável para aliviar a dor abdominal recorrente nas crianças.